quinta-feira, 21 de abril de 2011

John Lennon Era Meu Cão

Lennon não gostava de tomar banho, matava o calor embaixo da velha laranjeira do quintal, deitado na terra fria que escavava. Já era um cão velho, de olhos pesados, mas olhos que ainda tinham o mesmo brilho e sentimento que lhe fez merecer o nome e que ainda me cantavam os versos de "Imagine".

Olhos castanhos saindo de uma pequena massa negra de pelos. Um filhote desconfiado e sincero que me fez pensar no quão frágeis são os viventes sinceros. Frágil como era John Lennon por trás de toda aquela arrogância estrategicamente pontuada por choques neurais de sensibilidade. "Vou chamá-lo John Lennon".

Poderia ter sido Louis, Louis Armstrong poderia ter sido seu nome, pois também me fez pensar quanta beleza tem no mundo.

Vendo-o velho sob a laranjeira, e me perpassando aquele mesmo sentimento de quando ele era um filhote, duvidei que algum dia ele tivesse sonhado com as pessoas vivendo em paz ou com um mundo maravilhoso, pareceu-me então que esse era um sonho meu e aquela criatura repleta de sinceridade era a resposta ao meu sonho. Então era isso que eu via. Lennon nunca me cantou versos.

Espelhos. Todas as coisas nos são espelhos...

Quando Lennon morreu, eu não fiquei triste. Yoko, vendo o sangue, pensou: "morto como um cão". Então é assim que os cães morrem? Pobre homem! Pobre mulher! Nunca sentiram a areia fria que nos guarda sob a sombra de uma laranjeira.


Daniel Ferreira |colaborador|
de livro ainda inédito

Um comentário: